segunda-feira, 13 de julho de 2009

O funcionalismo público: padecendo no paraíso

Lembro-me bem das minhas expectativas quando fui nomeada para um cargo público numa secretaria do estado de São Paulo. Tivemos um "curso de integração" infame de dois dias, com dinâmica de grupo, teatrinho, momentos fala-que-eu-te-escuto de muita emoção e apresentação da própria secretaria onde trabalharíamos. Nem preciso dizer que a maior parte dos nomeados estava empolgada, achando que iria trabalhar com questões importantes, dar carteiradas por aí e se exibir para os parentes: "Creuzinha trabalha lá naquele prédio bonito no centro da cidade!" "Nooooossa, Cráudia! Sua filha se deu bem na vida, hein!". Tudo isso sem a preocupação de uma possível demissão.
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Dois meses depois já descobrimos que passaríamos o resto da vida numerando e rubricando páginas de processos (os mais sortudos... alguns carimbam e tiram grampos o dia inteiro), com funcionários beirando os 60 anos e já um tanto surtados (uma das minhas "calégas" chega no trabalho com uns 4 bobes na cabeça... cada um de uma cor) por tantos anos de carimbo num prédio velho e cheio de baratas e sendo alvo do olho gordo dos que só têm cargos em comissão.



"Bom dia, caléga! Como foi seu fim de semana?"



O mesmo deve acontecer quando for nomeada oficial de chancelaria. Achávamos que seríamos um mini-diplomata (sem o concurso absurdamente difícil), viajando pelo mundo e - quem sabe - fazendo um pouco de política externa. Ledo engano. O trabalho é administrativo (isso inclui alguma papelada, carimbos, atender telefonemas, resolver pepinos sobre a distribuição do pó de café do MRE, matricular filhinho de embaixador estrangeiro na UNB...), e talvez o auge da emoção na vida de um ofchan seja visitar um preso brasileiro numa prisão tailandesa.


Mas... e a carreira diplomática? A gente sonha com uma vida regada a champanhe, viagens, imoralidade e luxúria e negociações internacionais. Tem neguinho que acha que vai salvar subir na mesa do presidente dos Estados Unidos e gritar "Fora ALCA e FMI!" e salvar a pátria, outros acham que darão festinhas em Paris com cascatas de Ferrero Rocher (ai, que mega chique, Creuza!), e há ainda os que acham que usarão todo o conteúdo exigido no concurso e realmente farão... política externa.
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Eu não tenho tantas expectativas. Mas ainda assim curto o funcionalismo público. Porque ele me permite continuar com projetos paralelos. Entrei na Secretaria e usei o (longo) tempo ocioso para estudar para outros concursos: usei a biblioteca daqui, na hora do almoço caçava os livros nos sebos do centro e estudei muito na mesa de trabalho na maior cara de pau (afinal quem vai me despedir, hein?). Passei num concurso, tomarei posse em breve e por enquanto ainda continuo aqui. Mas ainda estudo durante o expediente, acho os livros do Magnoli por precinhos camaradas nos arredores e ainda recebo um salário por isso. Quero deixar claro que nem por isso atraso meu trabalho ou deixo de fazê-lo, hein! Sou responsável. Mas o trabalho é pouco, e uso o tempo restante.
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Enfim... se você é folgado como eu, tem um diploma que não vale muito no mercado de trabalho e gosta de estudar, o funcionalismo público é o seu lugar. Mas já sabe como isso termina, não é, caléga?
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Um comentário:

Anônimo disse...

Seu blog eh show..rsrs